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sábado, 06-07-2024
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Biografia

Biografia
                  

Américo Cortez Pinto  
[Leiria, 1896 - Lisboa, 1979]  

O seu primeiro livro poético data da verde adolescência, que, por entre ecos de Junqueiro e dos neo-românticos jacobinos, se reflecte no título e no corpo textual. Por isso, Lágrimas e Sorrisos (1912) é depois repudiado pelo autor, mau grado certa destreza formal de que dava sinal.

Em Coimbra, onde se forma em Medicina, Cortez Pinto está entre os que fundam a revista Ícaro, efémera mas significativa publicação (1919-1920) da heterogeneidade esteticista e neo-romântica então reinante. É essa, naturalmente, a situação estético-literária do segundo livro que Cortez Pinto já publicara em 1918 (Senhora da Renúncia, Seguida do Barba-Azul - Poema de Feitiçarias Medievais) e a indecisão de projectos que as obras anunciadas reflectem: de um lado, O Poema do Helenismo e A Apoteose dos Sentidos, promessas de modulação neopaganizantes da euforia naturista e hedonista própria do neo-romântismo vitalista, nada condizentes com a reorientação tradicionalista e ascética da obra futura; de outro lado, Rimances sobre a Vida do Rei Poeta e da Rainha Santa e Livro de Vilancetes, denunciando preferências temáticas e formais depois parcialmente confirmadas.

Mais do que colectânea de poesias dispersas, o livro de 1918 releva de uma ambição poemática que doravante será apanágio de Cortez Pinto e que transparece em breves macrotextos, com destaque para as sequências de sonetos de redondilha «Senhora da Renúncia» e «Barba-Azul». Esta organização poemática subserve, no fundo, a instrumentalização dos elementos temáticos e estilísticos de matriz finissecular a uma poética neo-romântica («Prólogo») e a uma cognata edificação espiritual.

Com efeito, tanto aliás, quanto o tríptico «Bailado das formas» (com seu virtuosismo de instrumentação verbal) ou o díptico «Beleza», aqueles poemetos desenvolvem-se como produtos de um epígono de Eugénio de Castro, o primeiro com o sumptuarismo decorativo, o esteticismo túrbido, o preciosismo lexical, o segundo com a bizarria sado-satânica e o exotismo mediévico da história de Gil de Rais. Mas ambos reconvertem essa experiência em escarmento moral e em apologia da conversão geracional à piedade cristã.

Também em Poema da Tentação - Nova Teoria da Humildade (1922) essa matriz finissecular é ao mesmo tempo omnipresente e ultrapassada; só que agora a integração superadora numa poética neo-romântica obsessivamente polarizada pela ascese cristã vê-se mediatizada pela vertigem paradoxal de protagonismo totalitário do eu e de descentramento desse eu própria do modernismo orfeico e das suas adjacências (com aqueles inerentes reflexos na imagística e na estilística da deixis pessoal e possessiva que mal despontavam em Senhora da Renúncia).

Durante cerca de dois decénios, Cortez Pinto pareceu cercear a vocação de criador poético. De longe em longe, uma ou outra composição lírica saía numa revista ou num jornal, enquanto o seu autor se empenhava em actividades profissionais e em funções públicas (inspector de Saúde Escolar, director do Instituto Português de Reumatologia, deputado em legislaturas do Estado Novo, etc.) e produzia a ampla bibliografia derivada da sua formação médica (que o levou até, tardiamente, a publicar em verso didáctico uns Mandamentos de Saúde para os Rapazes das Escolas), das suas opções políticas como intelectual nacionalista, do fervor do seu espírito religioso, da delicadeza da sua sensibilidade perante as artes plásticas, das suas afinidades electivas (raízes e aspirações) com outros poetas portugueses, da devoção pela língua pátria (em particular pela fraseologia e pelo léxico populares).

Mas em 1941 arrebata o Prémio de Poesia Antero de Quental com o livro A Alma e o Deserto, obra de continuada ansiedade espiritual, muito despojada da herança finissecular, discreta prossecussora das ousadias modernistas. O macrotexto que no interior do livro tem igual título ilustra a exploração psicológico-moral e metafísico-soteriológica de tópicos do imaginário histórico e maravilhoso do neo-romantismo lusitanista (a sebástica «Batalha das sombras», «A Nau Catrineta», a «Sereia», etc.).

A. Cortez Pinto é autor de numerosos trabalhos de índole médico-social, de investigação histórica e hagiológica, de formação cívica e doutrinária.
in Dicionário Cronológico de Autores Portugueses, Vol. III, Lisboa, 1994