José Cardoso Pires
[S. João do Peso, Castelo Branco, 1925 - Lisboa, 1998]
Vem viver para Lisboa muito jovem. Após concluído o liceu, frequenta o curso de Matemáticas Superiores da Faculdade de Ciências, que abandona para se alistar na Marinha Mercante como praticante de piloto sem curso. Viaja então por toda a costa de África, até ser forçado ao abandono dessa actividade.
Desde então, a sua actividade profissional centrou-se em torno da literatura e do jornalismo cultural, tendo sido director literário de várias editoras, director da revista Almanaque (cuja redacção era constituída por Luís de Sttau Monteiro, Alexandre O'Neill, Vasco Pulido Valente, Augusto Abelaira e o escultor José Cutileiro e que contava com a direcção gráfica de Sebastião Rodrigues), director-adjunto do jornal Diário de Lisboa (1974), redactor da Gazeta Musical e de Todas as Artes e crítico literário da revista Afinidades.
A partir de 1974, dedicou-se exclusivamente à escrita literária, reservando as colaborações jornalísticas a algumas séries de crónicas, posteriormente reunidas em livro (A Cavalo no Diabo), e a projectos especiais, como a reportagem sobre o Vietname – «Apocalipse 2» – publicada nas revistas Triunfo, de Madrid, e Hoy, do México.
No final da década de 60, vai para Londres, onde exerce funções de leitor no departamento luso-brasileiro do King's College (1969-71). Aí regressará mais tarde, como «resident writer» a convite da Universidade de Londres, entre 1979 e 1980.
Autor vário, do romance à sátira política, passando pelo teatro e pela crónica, José Cardoso Pires é considerado um dos maiores e melhores prosadores e contadores de histórias da literatura portuguesa contemporânea, tendo obras traduzidas numa quinzena de línguas. Nunca tendo integrado qualquer corrente literária específica – considerava-se a si próprio um «integrado marginal» –, acusa, no entanto, influências várias, desde o neo-realismo, no início da carreira, ao surrealismo, passando por Tchekov e por autores americanos como Poe, Hemingway, Melville. Resulta daqui um realismo crítico de estilo muito pessoal, caracterizado por grande depuração, tanto ao nível narrativo como sintáctico e vocabular, uma prosa viva e objectiva que foi tendo na actividade jornalística, desenvolvida ao longo dos anos, a sua oficina permanente.
A ligação do autor ao jornalismo começou na adolescência e manteve-se regularmente, sendo os marcos mais importantes deste percurso as passagens pela revista Almanaque, pelo Jornal do Fundão, pelo Diário de Lisboa e pelo Público.
É também apontado à sua escrita um cariz cinematográfico, de certa forma corroborado pelas várias adaptações de textos seus para o cinema. A mais recente adaptação foi o filme Balada da Praia dos Cães, realizado por José Fonseca e Costa, sobre o romance homónimo de 1982 que valeu a Cardoso Pires o Grande Prémio de Romance e Novela da Associação Portuguesa de Escritores.
Como dramaturgo, as suas peças O Render dos Heróis e Corpo Delito na Sala de Espelhos revelaram-se marcos importantes da dramaturgia portuguesa da segunda metade do século. O Render dos Heróis, levada à cena pela primeira vez em 1965, no Teatro Império de Lisboa, com uma encenação histórica de Fernando Gusmão, música de Carlos Paredes e interpretações, entre outros, de Carmen Dolores e Rui de Carvalho, será mais tarde (1989) a peça escolhida para a inauguração do Teatro da Malaposta, desta vez com encenação de Mário Barradas e música de António Victorino de Almeida. Corpo Delito na Sala de Espelhos, uma análise do «submundo da polícia política e [do] tecido psicológico da sua identificação como corpo de terror», foi levada à cena em 1979 no Teatro Aberto, em Lisboa, também sob direcção de Fernando Gusmão e com interpretações, entre outros, de Lia Gama, Mário Jacques e Rui Mendes.
A sua obra tem sido premiada internacionalmente (Prémio União Latina, Roma, 1991; Astrolábio de Ouro do prémio Ultimo Novecento, Pisa, 1992), tendo, em Portugal, o conjunto da obra sido distinguido com a atribuição, em 1997, do Prémio Pessoa e, em 1998, do Prémio Vida Literária da Associação Portuguesa de Escritores. Foi ainda condecorado com a Ordem da Liberdade e a Grã-Cruz de Mérito Cultural.
in Dicionário Cronológico de Autores Portugueses, Vol. V, Lisboa, 1998