Aquilino Ribeiro
[Sernancelhe, 1885 - Lisboa, 1963]
Aquilino Ribeiro nasceu em Sernancelhe (Beira Alta) em 1885 e faleceu em Lisboa em 1963. Uma juventude irrequieta levou-o a viver em pleno o ambiente revolucionário da República, participando em várias conspirações; foi professor de liceu, conservador da Biblioteca Nacional e co-fundador da revista Seara Nova. Após dois exílios em Paris, regressa, em 1932, a Portugal, fixando-se em Lisboa, onde se dedica totalmente à escrita.
Considerado um «excepcional animalista literário, com um dom insuperado de captar o brio e o bafo dos impulsos vitais e de estudar a gama da percepção sensorial verbalizada», segundo Óscar Lopes (s.d.: 1019), Aquilino Ribeiro – que foi um dos maiores romancistas e novelistas da língua portuguesa – deixou-nos três obras para crianças, escritas em momentos marcantes da sua vida familiar: o Romance da Raposa – surge em 1924, dedicado ao filho Aníbal; Arca de Noé, III Classe, é publicado em 1935 e tem como destinatário primeiro o filho Aquilino; em 1962, o nascimento da primeira neta leva-o a escrever para ela O livro de Marianinha.
As vivências de infância e as imagens de uma liberdade instintiva, alimentadas pelo ar da serra, fonte renovadora de energias para Aquilino, subjazem à sua escrita. Em Romance da Raposa, numa permanente intertextualidade com o fabulário e com os nossos contos tradicionais, Aquilino Ribeiro marca encontro com a verdade do mundo animal, enquadrando-o no seu ambiente natural e levando-o a agir de acordo com a sua natureza, sem no entanto perder a oportunidade de, através dele, se referir constantemente ao injusto e cruel mundo dos homens. Os seis contos de Arca de Noé, III Classe apresentam grau crescente de exigência no trabalho de descodificação de forma a acompanhar a maturação da criança leitora, sendo, contudo, preservada a opção de «uma interpretação lírica e dramática da vida animal». Em O livro de Marianinha encontramos a recuperação das imagens e vozes da infância do autor – rimas infantis mescladas de breves e divertidas histórias – deixadas a uma neta, como testemunho de uma identidade cultural a ser preservada.
A linguagem de Aquilino Ribeiro, marcante na sua individualidade, joga com a exploração das potencialidades mágicas presentes nas palavras mais insólitas, num permanente desafio à sensibilidade da criança e ao gosto pelas sonoridades inesperadas. Essa notável riqueza lexical oferece ao leitor a frescura de uma Natureza pronta a ser descoberta ou reencontrada.
Bibliografia selectiva: Romance da Raposa (1924), Venda Nova: Bertrand; Arca de Noé, III Classe (1936), Venda Nova: Bertrand; O livro de Marianinha (1962), Venda Nova: Bertrand.
[Rui Marques Veloso]
10/2011