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sábado, 20-04-2024
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Biografia

Biografia
                  

António Osório  
[Setúbal, 1933 - Lisboa, 2021]  

António Osório
Poeta e advogado em Lisboa. Foi bastonário da Ordem dos Advogados entre 1984 e 1986, administrador da Comissão Portuguesa da Fundação Europeia da Cultura e presidente da Associação Portuguesa para o Direito do Ambiente.

Dirigiu a Revista de Direito do Ambiente e do Ordenamento do Território, que fundou, e é director de Foro das Letras, revista da Associação Portuguesa de Escritores-Juristas. Colabora regularmente com crónicas no J.L.- Jornal de Letras, Artes e Ideias.

Tem livros publicados no Brasil, em Espanha, em França e em Itália e está também traduzido em revistas para francês, inglês e catalão. Tem participado em recitais de poesia no país e no estrangeiro, designadamente em Londres, Paris, Clermont-Ferrant, Roma, Madrid, Cuenca, Rio de Janeiro, Buenos Aires, Barcelona, Salzburgo, Viena e Frankfurt. Usa o nome literário António Osório.

Tendo-se estreado como poeta apenas na década de 70, embora já em 1954 colaborasse na revista Anteu, António Osório sai de algum modo da geração poética de que provém, sem contudo se integrar nas correntes literárias que por então se impunham: mais próximo da claridade antiga das vozes suas contemporâneas (Sophia, David, Ramos Rosa...) do que de certo formalismo de estruturas que caracterizaria a poesia portuguesa dos anos sessenta e setenta, a sua poesia representa nesse sentido uma inflexão nos caminhos do que então se tinha por modernidade.

A Raiz Afectuosa, título do seu primeiro livro, determina em boa parte a tonalidade de uma voz que se assume como vocação primordial, íntima e natural para uma espécie de canto da criação e do mistério da vida e da morte, do animal e do humano. Profunda, instintivamente afectuoso, este é um canto de grata, «inabalável ternura pelas criaturas» (Carlos Nejar, Prefácio a Emigrante do Paraíso, São Paulo, 1981), onde a morte figura sempre como escândalo, ainda assim parte integrante de um universo essencialmente uno e por essa unidade apaziguado. Por outro lado, «Osório actualiza, anula el tiempo en cuanto espejo deformador y convierte en familiar y fecundo lo que la lejanía histórica amenazaba com estrañar del mundo de nuestras vivencias [...] Lo sintético de la expresión, lo depurado del lenguage y la sobriedade del ornato envuelven a esta poesia ejemplar en un ambiente de luminoso – y muy actual – clasicismo» (Angel Crespo, «Introducción» à Antologia de la Poesia Portuguesa Contemporánea, Madrid, 1982).

«Dizer com claridade o que existe em segredo» (Cecília Meireles, epígrafe a Planetário e Zoo dos Homens) é o expediente da força reveladora desta poesia que tem tanto de religiosa na capacidade de diálogo com os deuses e o universo como de pagã na sua proximidade dos animais. Esse o sentido muito particular das últimas obras do A., mas em especial de Ofício dos Touros, talvez a mais elegíaca, mas também – surpreendentemente na tranquila harmonia cósmica do conjunto da sua poesia – das mais violentas nessa intimidade e nesse respeito pela dignidade de um muito humano medo animal.

Neste contexto deve ainda mencionar-se o título mais recente – Bestiário –, a respeito do qual, e depois de lhe salientar «esta reverência para com o real», Eugénio Lisboa refere: «O poeta fala deles [dos animais] com a mesma emoção discreta, com a mesma ligação "de ordem afectiva indissolúvel" que o liga aos humanos de todos os ofícios» (cfr. JL de 1 de Julho de 1998).

Mas já antes, e talvez sobretudo desde Aforismos Mágicos, a poesia de António Osório tendia para o poema breve, tenso, e para a expressão contida de uma essencialidade vital: aforística é tendencialmente a escrita não apenas desse mas da generalidade dos livros de António Osório, onde os poemas se inscrevem ao ritmo do hai-ku, num despojamento de ressonância oriental e muitas vezes firmados por uma espécie de moralidade de fábula.

Mais do que de discursos poéticos, trata-se de inscrições poéticas que parecem ser o resultado de uma grande e humilde disponibilidade para a atenção a uma secreta, calada evidência das coisas: «Essa arte vestigial, esse manejo delicado, amoroso e vigilante das pequenas coisas, essa vibrátil pulsação do que parece não ter peso ou relevância, eis um dos notáveis atributos desta obra que reconhece com lucidez a sua vocação prestável: "O pequeno rebocador ajuda silenciosamente o grande petroleiro" (A. M., 19) e, com efeito, o ínfimo, o insignificante, o humílimo, adquirem um estatuto muito particular nesta poesia capaz de devotar-se "a um mirto" (R. A., 42) ou a "uma lupa" (D. A., 94), capaz de atentar na rasteira beleza de um "buxo" (I. M., 75), no "último segundo de uma larva" (I. M., 39), na graça que os milénios preservaram em duas pequenas "tanagras" (I. M., 83) ou na textura de uma "gota de água" em cujo interior nos convida a penetrar (cfr. D. A., 83). Não devemos espantar-nos, pois desde a abertura de R. A. fora acentuada essa vontade de não esquecer o ínfimo: "Com os anos/ a pouco e pouco/ a raiz afectuosa/ penetrou/ no fundo da terra/ até chegar/ ao mais pequeno/ e mais antigo/ veio de lágrimas" (R. A., 13)"» (cfr. Fernando Pinto do Amaral, «António Osório: O Humano e Humilde Labor da Poesia», in O Mosaico Fluido).

Os últimos livros de António Osório configuram-se muitas vezes como poemas em prosa ou desenvolvem-se como pequenas narrativas ou crónicas da notação sensível de uma realidade onde ainda assim ressaltam aquelas mesmas características.
in Dicionário Cronológico de Autores Portugueses, Vol. VI, Lisboa, 1999