Cada um que lê reúne-se a uma imensidade pensante, em repouso, quem lê está em estado de levitação, pertence a uma imagem pairante.
Filomena Molder
Se
é certo que pertencemos a uma das culturas do livro e da
leitura (como o blogue "O
silêncio dos livros" tão
bem ilustra), falar em livros e em leituras obriga-nos hoje
a falar em redes
sociais de leitores,
cuja força e dimensão a internet fez disparar vertiginosamente nos
últimos anos. Ler, criticar e recomendar livros, discutir correntes
literárias e dialogar sobre e com autores, são o móbil
que consolida e expande estas novas redes de leitores.
Neste
sentido, o Bookcrossing (2001) é talvez
a mais conhecida destas primeiras redes de leituras partilhadas. Em 2014, contava com mais de um milhão de leitores e mais de 10
milhões de livros registados, em mais de uma centena de países.
Em Portugal desde 2005, o Bookcrossing Portugal encontra-se
em 9º
lugar na lista mundial de países em que esta rede de leitores
se encontra ativa. Diversas bibliotecas, cafés e pastelarias,
entre outros lugares de convívio, são zonas oficiais
de Bookcrossing e
pontos de encontro físico desta família
de leitores originários do mundo virtual.
Já um
sítio como Shelfari, criado,
em 2006, por e para amantes de livros e totalmente assente
na dimensão virtual, oferece a cada um dos seus utilizadores a
possibilidade de ir construindo uma «prateleira» de livros, de os
discutir com outros leitores, e de os recomendar a outros. Com
a crescente dimensão destas redes sociais de leitores, a
respetiva importância financeira aumentou exponencialmente e
explica por que foi a Shelfari comprada pela Amazon um ano e
meio após a sua primeira edição.
Também
a We
Read acabou comprada pela megastore distribuidora FlipKart. Criada
por Krishna Motukuri e Harish Abbott que, em 2007, deixaram a Amazon
para criar a WeRead em Bangalore, na Índia, em três
anos reuniram mais de 3 milhões de leitores registados
e mais de 60 milhões de recensões livros. Fundada em
2006 como iRead, este sítio permitia aos seus leitores, através
de uma série de aplicações em rede, enviar e receber recensões
bibliográficas. Num mundo em que «todos podem publicar», o
valor de WeRead para a sua comunidade em acelerado crescimento (1.9
milhões em 2008), era o de uma fonte independente e fiável de
avaliação crítica de uma obra. Para ter uma ideia
da importância deste projecto, propomos a leitura do artigo
de Anirvan Ghosh publicado no The Economic Times.
Esta
nova (e anteriormente impossível) forma de socialização de
leitores online tem-se revelado extremamente dinâmica
e criativa, como o comprovam, entre outros, os sítios Goodreads,
nascido em 2007 e hoje com 30 milhões de membros, 900 milhões
de livros e 34 milhões de recensões críticas. Também o Library
Thing (LT), um sítio de «indexação social» de livros e
respetivas recensões e notas, concebido em 2005 para «armazenar e
partilhar catálogos de livros e diversos tipos metadados, passou a
ser massivamente utilizado por autores, indivíduos, bibliotecas e
editores (Wikipédia).
Em 2013, com 1.65 milhões utilizadores e 80 milhões de livros
catalogados, foi comprado pela Amazon.
Já
o Book
blogs, por exemplo, representa um salto qualitativo destas novas
associações de grandes leitores de edição corrente:
os respectivos membros não apenas lêem livros, como os
divulgam (e não apenas em blogues), e ainda os escrevem.
Dos emails ao Facebook e ao Twitter (agora X) um
número inimaginável de pessoas que, sem "este novo mundo" pouco
ou nada leriam e muito menos escreveriam, passaram a fazê-lo.
O blogue (contração de web log) costuma ser o exemplo
de excelência. Criado em 1997 para designar sites cuja
estrutura dinâmica e interface amigável facilitavam a publicação
imediata de textos, imagens e sons, sem a mediação de webmasters ou
especialistas em tecnologia, propiciaram a publicação de um número
gigantesco e dificilmente estimável de blogues, que, no seu
conjunto, constituem veículos de promoção das mais diferentes formas
de expressão democrática, os especialistas são hoje unânimes na
afirmação dos benefícios desta prática, tanto na formação de
hábitos de leitura e escrita.
Para
além de todas estas grandes comunidades de leitores, existem também
inúmeros projectos individuais cuja dimensão está por reconhecer e
de aqui apenas damos um breve apontamento: através da proposta de
consulta de sítios como Campaign
for the american reader (CftAR) da autoria de
Marshal Zeringue, um escritor e produtor americano, uma
iniciativa independente que visa encorajar mais leitores a ler
mais. Ou o Reader’s Project, da
autoria da especialista italiana em informática Glória Rossi,
que tem como objectivo oferecer uma galeria virtual de
fotografias de momentos de leitura, de livros e de estantes que nos
revelem quem somos enquanto leitores. Ler
por aí, o sítio português de Margarida Branco (também
no Facebook)
propõe entre 2009 e 2013. livros para ler em lugares onde ir.
Assim,
é já hoje consensual que o século XXI viu surgir novas
práticas de leitura e de escrita largamente partilhadas. Beyond the book project dá-nos conta da importância deste novo fenómeno
literário de leitura de massas. Como e por que razões surgem e se
desenvolvem estas novas comunidades de leitores, e qual a actual
função popular da ficção literária, constituem os objectos deste
estudo transnacional, elaborado para os Estados Unidos da América,
Reino Unido e Canadá. A listagem das ligações deste
sítio aponta-nos o caminho e a dimensão da leitura e da escrita do
século XXI. Em Portugal, o sítio “Segredo dos livros” (2006)
de Fátima Rodrigues, dedicado à ficção editada no
nosso país, contava já em 2007 com o apoio de inúmeros
leitores e de algumas editoras. É um portal que se
quer da lusofonia e conta com cerca de 40000 membros, 2000
livros divulgados e cerca de 5000 notas e recensões, e mais
de 1 milhão de visitas.
Por
último mas não em último, chamamos a atenção para
extraordinária base de dados RED
- The reading experience database em acesso aberto que
reune já mais de 30 000 registos de experiências
de leitura de subditos britânicos, ou de visitantes das
ilhas britânicas, documentadas entre 1450-1945, tanto no no Reino
Unido como no estrangeiro. Contempla todo o tipo de
leitores, conhecidos ou anónimos, e as suas respetivas leituras. Fonte de
formação e de pesquisa, este projeto tem cerca de 2000
visitantes por mês, oriundos de mais de 1000 países
diferentes. Iniciada no Reino Unido em 2006, internacionalizou-se a
partir de 2011, com a criação de bases de dados compatíveis sobre a
experiência leitora na Austrália, no Canadá, na Holanda (Países Baixos) e na Nova
Zelândia.
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