Maria Isabel Barreno
[Lisboa, 1939 - Lisboa, 2016]
Ficcionista e ensaísta. Licenciada em Ciências Histórico-Filosóficas pela Faculdade de Letras de Lisboa, Maria Isabel Barreno encontra-se radicada em França, onde, desde 1996, coordena a nível institucional o ensino da língua portuguesa.
A autora é facilmente identificada pela opinião pública como co-autora das Novas Cartas Portuguesas – as outras são Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa –, obra que, em 1972, provocou um pequeno tumulto na vida literária portuguesa. O halo de escândalo que rodeou o processo judicial, internacionalmente conhecido como «o caso das três Marias», teve repercussão planetária, em parte por causa da conjuntura política (desfavorável ao regime de censura), outro tanto graças ao hábil aproveitamento mediático que dele fizeram os movimentos feministas anglo-saxónicos e franceses. Como consequência imediata, Maria Isabel Barreno foi então convidada a proferir conferências em diversas universidades norte-americanas, sempre no âmbito dos movimentos de «libertação» da mulher.
Mas nem toda a sua obra tem esse recorte militante. Justamente apontada, na transição dos anos 60 para os anos 70, como uma das responsáveis pela renovação da novelística portuguesa, pode-se dizer, do primeiro livro – De Noite as Árvores São Negras, 1968 –, que ele questiona os procedimentos narrativos tradicionais, numa linha que, à falta de melhor caracterização, andará próxima do nouveau roman, com alguns laivos de um existencialismo tardio. De acordo com Maria Alzira Seixo, desde cedo a autora desenvolveu «um estudo do drama que opõe o ser ao existir (ou que impede a sua coerência relativa), numa forma romanesca que tem muito do encadeamento meditativo [...] e que, adoptando a técnica da mudança do ponto de vista, realiza a comunicação ficcional através de fragmentos de discurso que assumem uma voz narrativa.»
Ao longo dos últimos trinta anos, Maria Isabel Barreno construiu uma obra ficcional de dimensões não negligenciáveis, nunca abdicando de uma coerência intelectual irrepreensível. Mas o lugar-comum do enfoque libidinal, aliado às reivindicações feministas (legenda redutora com que alguns sectores da crítica pretendem subvalorizar o que há de mais genuíno na sua escrita), não encontra eco nos livros mais recentes, seja nos penetrantes contos de Os Sensos Incomuns, de 1993, colectânea que lhe valeu alguns dos mais importantes prémios nacionais, seja no romance de estrutura convencional, como acontece com O Senhor das Ilhas, de 1994, minuciosa cenografia das suas origens caboverdeanas (o livro foi oficialmente adoptado como obra de leitura obrigatória no ensino secundário de Cabo Verde).
Por outro lado, no âmbito da actividade profissional desenvolvida no Instituto Nacional de Investigação Industrial (e mais tarde no Instituto de Estudos para o Desenvolvimento), Maria Isabel Barreno tem publicados diversos estudos relacionados com a integração dos trabalhadores rurais em meio industrial. Esses estudos, não obstante a sua inescapável índole técnica, são uma espécie de contraponto ao universo dominante da ficção, centrada quase sempre nos estratos liberais da burguesia urbana.
Com Isabel da Nóbrega, Urbano Tavares Rodrigues, Agustina Bessa-Luís, Augusto Abelaira, etc., foi co-autora de um volume colectivo sobre A Condição da Mulher Portuguesa, publicado em 1968.
Cronista e autora de textos de carácter ensaístico, dispersos por jornais e revistas nacionais e estrangeiros, a sua actividade jornalística mais visível coincide com os anos em que foi chefe de redacção da edição portuguesa da revista Marie Claire.
in Dicionário Cronológico de Autores Portugueses, Vol. VI, Lisboa, 1999