Odette de Saint-Maurice
[Lisboa, 1918 - Lisboa, 1993]
Odette Passos y Ortega Más de Saint-Maurice Ferreira Esteves nasceu em Lisboa – segundo a própria – «por acaso», oriunda de famílias do Norte descendentes do conde de Saint-Maurice. Filha única, criada na cidade do Porto, nunca frequentou o liceu, como era habitual na alta burguesia da época, mas terminou o curso de Piano no Conservatório e casou com o conhecido pediatra Constantino Esteves, de quem se viria, entretanto, a divorciar.
A sua vida literária, porém, não se pontuou pela mesma obediência à norma vigente, já que começou por publicar o seu primeiro conto, «O Anel da Princesa», no Pim-Pam-Pum com pouco mais de 10 anos. Aliás, a autora disse por mais de uma vez que desde sempre adorou inventar histórias e que, com medo que se zangassem com ela, dizia que quem lhas contava era a cozinheira do avô.
Estreia-se «oficialmente» na vida literária com o livro O Canto da Mocidade (1938). Foi, desde muito jovem, colaboradora permanente do Rádio Clube Português no programa intitulado «Senhor Doutor», de Oliveira Cosme, nunca deixando de escrever – sob o pseudónimo (nessa altura) Maria da Saudade – romances para os mais jovens.
Estreou-se na Emissora Nacional em 1956, já com uma obra literária consolidada (teatro infantil, contos, mas, sobretudo, os seus primeiros romances de grande fôlego) e, como escritora, produtora e realizadora dos seus próprios programas radiofónicos, foi notável o seu desempenho, não só no âmbito da escrita de peças inéditas extremamente bem elaboradas sob o ponto de vista técnico e dramático, como no da adaptação de obras literárias aos mesmos fins.
O rigor com que seleccionava, enfim, os intérpretes e com que encarava os ensaios e as gravações proporcionou, aliás, o lançamento de dezenas de actores e gentes do espectáculo, nomes posteriormente consagrados, como por exemplo João Motta, João Perry, João Lourenço, Júlio Isidro, Pedro Barroso, Luís Miguel Cintra, Irene Cruz, Henriqueta Maia ou António Vitorino de Almeida (que veio, inclusivamente, a tornar-se seu genro). Momentos altos desta actividade radiofónica foram sem dúvida as adaptações literárias feitas pela autora, de que se destacam A Ilustre Casa de Ramires e O Apóstolo da Juventude, sobre a vida de São João Bosco, que mereceu o 1º. Prémio do júri, em Barcelona, no ano de 1968, no concurso internacional «Ondas» de programas radiofónicos.
José Tengarrinha, num belíssimo livro subordinado ao tema A Novela e o Leitor Português: Estudo de Sociologia da Leitura (1973), reconhece-a como «a escritora mais lida entre os autores vivos».
Por volta dos anos sessenta edita mais de trinta discos para crianças, entre os quais A Princesa Que Guardava Patos, Maria Pequenina, As Cidras do Amor e Os Três Anõezinhos (da sua autoria).
Após um período de suspensão (1974-1982), voltou a colaborar nas ondas da rádio, agora na Antena Um, nomeadamente na rubrica «Tempo de teatro». Quando faleceu, vitimada por um cancro, aos 74 anos, estreava o seu último grande trabalho radiofónico, a adaptação da peça de Alexandre Ostrovski, «O Grande Casamento».
Também em princípio dos anos 80, coincidindo com as suas bodas de ouro literárias, escreveu a primeira telenovela portuguesa, que inicialmente se chamava «João Godunha», nome posteriormente preterido em favor de «Vila Faia», uma das muitas divergências que a terão levado a afastar-se do projecto. Outra experiência para televisão tinha já sido feita, uma notável adaptação de um texto de Camilo Castelo Branco a que deu o nome Cinco Filhas para Casar.
Quanto à sua vasta bibliografia, sobretudo dedicada aos adolescentes, ela foi pontuando regular e ininterruptamente toda a sua vida. A morte surpreendeu-a com um livro de poesia «entre mãos» e outro a ser ultimado, na colecção de teatro da SPA, enquanto uma editora de Aveiro lhe vinha, desde 1990, reeditando a obra completa, cujos primeiros 5 volumes já estavam nas livrarias (os 3 mais recentes já com a chancela do Instituto da Juventude).
A sua vida privada influiu igualmente no seu percurso de autora. Aos 56 anos, Odette de Saint-Maurice transformou-se, em Minde, numa das suas personagens de ficção, conhecendo frei Vicente, 24 anos mais novo e que abandona o hábito franciscano para se casar com ela. Os últimos 18 anos da vida da escritora serão passados em Óbidos, onde se instalam, de onde viajavam para todo o país, visitando escolas desde que em 1978 lançaram um disco notável, com letra de Odette de Saint-Maurice e música do próprio Vicente do Nascimento, intitulado Canções de Bem-Querer.
Utilizou também os pseudónimos Magali e Saint-Auge.
in Dicionário Cronológico de Autores Portugueses, Vol. IV, Lisboa, 1997