A POEM THAT CAN SERVE AS AN AFTERWORD
streets where the danger is obvious green arms of occult practices corpses floating on the water sunflowers and a body a body for blocking the day’s lamps a body for falling through a landscape of birds for going out early in the morning and coming back very late surrounded by dwarfs and lilac fields a body for covering your absence like a bedspread a place setting a perfume
this or its contrary, but somehow gaping and with many people there to see what it is this or a population of sixty thousand souls devouring scarlet pillows on their way to the sea and arriving, at dusk, next to the submarines
this or a torso dislodged from a verse and whose death makes everyone proud o pallid city built like a fever between two floors! we’ll home deliver dirt for filling up candelabras smoldering beds for erect lovers slates with forbidden words – a woman for the fellow who’s losing interest in life (Here, take her!), two grandchildren for the old woman at the end of the line (That’s all we have!) – we’ll pillage the museum give a diadem to the world and then require it to be put back in the same place, and for you and for me, favorably situated, some poison to pour into the giant’s eyes
this or a face a solitary face like a boat in search of a gentle breeze for the night if we’re sand that’s sifted in a slack wind among painted bushes if an intention is bound to reach its shore like the ocean’s currents shipwrecks and storms if the man of hostels and boardinghouses lifts his damp cratered forehead if the sun outside is shining more than ever if for a minute it’s worth waiting this or happiness in the simple form of a pulse shimmering amid the foliage of the loftiest lamps this or the said happiness the airplane of cards that comes in through the window that goes out by the roof so does the pyramid exist? so does the pyramid say things? is the pyramid each person’s secret with the world?
yes my love the pyramid exists the pyramid says many many things the pyramid is the art of dancing in silence
and in any case
there are public squares where a lily can be sculpted subtle regions where blueness flows gestures belonging to no one boats underneath flowers a song by which to hear you arrive
© Translation: 1998, Richard Zenith
| POEMA PODENDO SERVIR DE POSFÁCIO
ruas onde o perigo é evidente braços verdes de práticas ocultas cadáveres à tona de água girassóis
e um corpo
um corpo para cortar as lâmpadas do dia um corpo para descer uma paisagem de aves para ir de manhã cedo e voltar muito tarde rodeado de anões e de campos de lilases um corpo para cobrir a tua ausência como uma colcha um talher um perfume
isto ou o seu contrário, mas de certa maneira hiante e com muita gente à volta a ver o que é isto ou uma população de sessenta mil almas devorando almofadas escarlates a caminho do mar e que chegam, ao crepúsculo, encostadas aos submarinos
isto ou um torso desalojado de um verso e cuja morte é o orgulho de todos ó pálida cidade construída como uma febre entre dois patamares! vamos distribuir ao domicílio terra para encher candelabros leitos de fumo para amantes erectos tabuinhas com palavras interditas – uma mulher para este que está quase a perder o gosto à vida – tome lá – dois netos para essa velha aí no fim da fila – não temos mais – saquear o museu dar um diadema ao mundo e depois obrigar a repor no mesmo sítio e para ti e para mim, assentes num espaço útil, veneno para entornar nos olhos do gigante
isto ou um rosto um rosto solitário como barco em demanda de vento calmo para a noite se nós somos areia que se filtre a um vento débil entre arbustos pintados se um propósito deve atingir a sua margem como as correntes da terra náufragos e tempestade se o homem das pensões e das hospedarias levanta a sua fronte de cratera molhada se na rua o sol brilha como nunca se por um minuto vale a pena esperar isto ou a alegria igual à simples forma de um pulso aceso entre a folhagem das mais altas lâmpadas isto ou a alegria dita o avião de cartas entrada pela janela saída pelo telhado ah mas então a pirâmide existe? ah mas e então a pirâmide diz coisas? então a pirâmide é o segredo de cada um com o mundo?
sim meu amor a pirâmide existe a pirâmide diz muitíssimas coisas a pirâmide é a arte de bailar em silêncio
e em todo o caso
há praças onde esculpir um lírio zonas subtis de propagação do azul gestos sem dono barcos sob as flores uma canção para ouvir-te chegar
© 1957, Mário Cesariny From: Manual de Prestidigitação Publisher: Assírio & Alvim, Lisbon, 2005 ISBN: 972-37-1007-2
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